quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Cerâmicas radioativas

Pesquisadores do Ipen, USP e UFPA estudam propriedades físicas e químicas de cerâmicas marajoaras por meio da análise nuclear de seus fragmentos (foto: Casimiro Munita)

23/01/2008

Por Thiago Romero

Agência FAPESP – Pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal do Pará (UFPA) estão estudando a composição de cerâmicas originais da ilha de Marajó, no Pará, por meio da análise nuclear de seus fragmentos.

A técnica utilizada, chamada análise por ativação com nêutrons, permite desvendar aspectos como as tecnologias envolvidas na produção das peças, rotas de comércio e interações entre os povos, além de diferenciar peças verdadeiras e falsas para combater o comércio ilegal desses objetos do patrimônio histórico.

Com broca semelhante às utilizadas nos consultórios de odontologia, pequenos furos são feitos nos objetos para a extração de quantidades mínimas de pó, que é peneirado, depositado em uma estufa e irradiado no núcleo do reator de pesquisas do Ipen. Com a técnica é possível analisar, em média, entre 20 e 30 elementos químicos nas amostras, como ferro, cobalto, manganês ou alumínio.

“Irradiamos as amostras com uma fonte de nêutrons dentro do reator nuclear. Atingimos uma massa controlada de radioatividade para, em seguida, quantificar a composição química da amostra em um detector de radiação gama”, explicou Casimiro Munita, pesquisador da Divisão de Radioquímica do Ipen e responsável pelo projeto, à Agência FAPESP.

No detector de radiação gama, equipamento também disponível no Ipen, a amostra de pó cerâmico radioativo produz pares de íons, que são detectados pelo equipamento. A partir dos diferentes espectros de radiação gama que se formam no meio analisado, os pesquisadores determinam a concentração de cada elemento presente na amostra. “Com esse tipo de técnica é possível identificar quase todos os elementos da tabela periódica que possam existir em uma amostra de cerâmica”, disse Munita.

Utilizando métodos estatísticos para comparar a concentração dos elementos químicos nas amostras de pó de diferentes objetos, como urnas, vasos, tigelas, garrafas, pratos e estatuetas marajoaras, os pesquisadores conseguem saber quais peças são originais e quais são réplicas. As peças originais foram produzidas no período compreendido entre 1000 a.C e 600 d.C

“O método de análise por ativação com nêutrons é utilizado desde 1938. No Brasil, a técnica começou a ser experimentada em 1957, quando entrou em operação o reator do Ipen. Nesses 50 anos de operação do reator, é a primeira vez que a técnica é aplicada no estudo de objetos históricos da ilha de Marajó”, afirmou Munita.

O trabalho serviu de incentivo para a criação, em 2007, pela Câmara de Pós-Graduação da USP, da disciplina de Introdução à Arqueometria, área que estuda as propriedades físicas e químicas dos objetos arqueológicos, ministrada por Munita no Museu de Arqueologia e Etnologia.

A disciplina tem o propósito de mostrar como as propriedades físicas e químicas dos objetos arqueológicos e as técnicas estatísticas podem dar contribuição à arqueologia e ajudar a desvendar problemas que seriam de difícil resolução sem o auxílio das ciências exatas.

“Trata-se da primeira disciplina de arqueometria a ser criada no Brasil. Já temos 18 alunos de pós-graduação, que desenvolvem projetos de iniciação científica, de mestrado, de doutorado e de pós-doutorado na área”, disse o professor.

Resultados preliminares do projeto, que tem apoio da FAPESP na modalidade Auxílio a Pesquisa e da Agência Internacional de Energia Atômica, serão divulgados em publicações científicas e congressos internacionais da área no decorrer de 2008. “Já sabemos, por exemplo, a temperatura de queima das cerâmicas marajoaras originais, que era de aproximadamente 900ºC”, apontou Munita.

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