quinta-feira, 17 de janeiro de 2008
Do laboratório para a maternidade
Pesquisadores do Centro de Toxinologia Aplicada do Instituto Butantan descobrem substância no veneno da jararaca que, de acordo com testes em camundongos, mostrou-se eficaz no combate à pré-eclâmpsia, caracterizada pela pressão alta na gravidez
17/01/2008
Por Thiago Romero
Agência FAPESP – Cientistas do Centro de Toxinologia Aplicada (CAT) do Instituto Butantan encontraram uma nova droga no veneno da jararaca capaz de combater a pré-eclâmpsia, problema caracterizado por um quadro de hipertensão gestacional que atinge mulheres a partir da vigésima semana de gravidez.
Calcula-se que no Brasil cerca de 3,2 milhões de mulheres ficam grávidas por ano e, segundo o Conselho Brasileiro de Cardiopatia e Gravidez, 10% dessas gestantes apresentam pré-eclâmpsia, que é associada a cerca de 25% dos óbitos maternos.
Nos experimentos com o veneno da serpente, os pesquisadores identificaram uma molécula que, em animais, mostrou possuir um mecanismo de ação capaz de atuar diretamente nas artérias para manter os vasos sangüíneos relaxados, controlando a pressão arterial. Os responsáveis pelo achado são os doutorandos Juliano Guerreiro e Claudiana Lameu Gomes, orientados pelo professor Antonio Carlos Martins de Camargo, coordenador do CAT, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids) da FAPESP.
“Trata-se de uma molécula, isolada do veneno da Bothrops jararaca, que faz parte de uma classe de peptídeos com ação anti-hipertensiva. São cerca de 25 peptídeos que estão sendo patenteados”, disse Juliano Guerreiro à Agência FAPESP. A equipe submeteu pedido de patente da substância no Brasil, nos Estados Unidos e na Europa. “Por isso não podemos revelar as moléculas da substância nem seus mecanismos de ação”, afirma.
A eficácia da nova droga para o tratamento da pré-eclâmpsia foi comprovada em testes com dezenas de camundongos fêmeas. “Como essa classe de peptídeos isolada do veneno possui ação anti-hipertensiva, os testes foram realizados por meio de tentativa e erro. Induzimos nos animais uma série de patologias relacionadas com a pressão alta para verificar quais peptídeos seriam capazes de combatê-las”, explica Guerreiro.
“Apesar de a pré-eclâmpsia ser estritamente humana, ao reproduzirmos esse distúrbio nos camundongos conseguimos identificar na molécula o mecanismo para seu tratamento. Esse mecanismo está envolvido na liberação de óxido nítrico, gás que, indiretamente, é responsável pelo relaxamento dos vasos sangüíneos das artérias para o controle da pressão”, complementa.
Segundo Guerreiro, “a molécula que se mostrou eficaz no tratamento da pré-eclâmpsia é inédita no Brasil e no mundo”. “Os medicamentos usados no combate à pré-eclâmpsia são os mesmos utilizados para a hipertensão, que não levam em conta as peculiaridades do organismo de uma gestante”, disse o pesquisador.
O próximo passo do estudo será analisar a toxicidade da substância. “Precisamos descobrir, por meio de testes in vitro e em animais, se existe alguma interferência da droga no desenvolvimento do feto”, conta. Se tudo der certo, os testes em humanos deverão ter início após essa fase. Ainda não há previsão para que a droga esteja disponível comercialmente.
Além da pressão arterial alta, na pré-eclâmpsia também podem ocorrer a retenção de líquidos e a presença de proteína na urina, podendo assim evoluir para convulsão e coma (eclâmpsia). O distúrbio deve ser diagnosticado e tratado de forma rápida, durante o pré-natal, já que ele pode restringir o fluxo de sangue para a placenta e colocar a vida do feto e da mãe em risco.
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