sexta-feira, 13 de junho de 2008

Fórum aborda pontos críticos do Cerrado

O fórum com enfoque para o Cerrado, importante bioma brasileiro, paulatinamente ameaçado de extinção por ações predatórias do homem, foi inserido como uma das prioridades do 10º Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica), na Cidade de Goiás, e a primeira parte aconteceu nesta quinta-feira, 12, no Teatro São Joaquim.

Sob o tema “O Cerrado, o Clima e o Meio Ambiente”, o fórum foi aberto pela presidente da Agência Goiana de Cultura (Agepel), Linda Monteiro, destacando que a realização do evento fortalece as discussões ambientais, especialmente com o tema do Cerrado, tangenciando questões que hoje perpassam o mundo todo.

“Se nós, egressos do Cerrado, não nos posicionarmos nessa discussão, que é uma questão de defesa do cotidiano, estaremos em falta com as futuras gerações”, acentuou, citando as crianças como verdadeiras defensoras das questões ambientais.

Coordenado por Altair Sales, graduado em Antropologia pela Universidade Católica do Chile, com especialização em arqueologia e geologia, o Fórum do Cerrado contou com a participação de Harlen Inácio dos Santos, doutor em Ciências Ambientais – Gestão de Recursos Hídricos, pela Universidade Federal de Goiás, falando sobre “Desafios para a gestão dos recursos hídricos do bioma Cerrado”.

Outro convidado presente, com o tema “Uma reminiscência do Cerrado”, foi Binômino da Costa Lima (Seu. Meco), membro do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás e detentor do título de Notório Saber, conferido pela Universidade Católica de Goiás. O terceiro palestrante convidado, o biólogo e ambientalista João Paulo Capobianco, secretário-executivo do Instituto Sócio-Ambiental, do Ministério do Meio Ambiente, que faria a palestra inicial, sobre “Políticas para o Cerrado”, não pôde comparecer por motivos de força maior.

Altair Sales destacou a importância do fórum, com um tema de suma importância não só para a vida do Cerrado, mas de todo o planeta. Interferência e destruição Binômino da Costa Lima, o Seu Meco, morador e conhecedor da região de Jataí (GO), no sudoeste goiano, tendo sido um dos fundadores da Sociedade Ecológica de Jataí (Seja), iniciou sua palestra falando de coisas, na natureza, que “a visão normal das pessoas às vezes não percebe”.

Se as reminiscências tiveram um certo tom poético, também os teve tragicamente telúricos, com laivos de ironia provocando risos da platéia. Mostrando que, a cada dia que passa, aumentam as interferências e destruições no bioma Cerrado, o palestrante deu o seu testemunho sobre o ciclo dessa destruição: o boi, a soja e agora a cana. Ilustrou o cenário falando da chegada dos tratores, a destruição das gramíneas nativas e das raízes profundas que não vão mais brotar. “Trocou-se o boi pelo trator, plantou-se o capim brachiara onde havia capim-gordura.

Com o trator, veio o boom da soja. O gringo chega diante de uma árvore que nem conhece e que sua família nunca plantou, e derruba-a. Os invasores não trazem melhorias, não fazem nada, e quando tudo se acaba, eles procuram outro lugar para destruir. De uns tempos para cá, estão derrubando tudo. Destroem o Cerrado e vão para a Amazônia. Estão drenando, planando, arando e liquidando, destruindo as nascentes dos rios.

Só em Rio Claro (GO), nove nascentes já secaram”, acentuou, indignado. E finalizou dizendo que, no Brasil, o que é bom acaba, e o que é ruim só aumenta.

O problema da água

Harlen Inácio dos Santos iniciou sua palestra informando que abordaria “temas mais áridos, menos romântico de se ouvir, porquanto cheio de tabelas e leis”. Enfatizou a questão da água, a gravidade ou não da problemática da água no mundo, lembrando os rumores alarmistas de que a água vai acabar e que a guerra futura será pela água. Explicou o significado de “recursos hídricos”, que se referem ao excedente do uso da água, bem como de “água potável”, expressão, segundo ele, usada indiscriminadamente.

Esclareceu que água potável é produto industrial que deve se adequar ao consumo humano, conforme portaria do Ministério da Saúde, e que a expressão “água doce de qualidade” indica facilidade de tratamento para se obter água potável.

Com essa ligeira didática, Harlen conduziu sua palestra para o entendimento da platéia em relação ao uso da água. Discorreu também sobre o que vem a ser “uso consultivo” e exemplificou: se você tira água de uma bacia de rio, sangra a vasão e a água não volta mais para o rio. No sistema de irrigação por meio de pivôs, por exemplo, ocorre muita vasão de água. Já no caso da energia elétrica, por meio de usinas, utiliza-se a água e a mesma retorna à sua origem, tendo-se aí o “uso pouco consultivo”.

Com relação ao Cerrado, observa-se um diferencial importante, com o regime hídrico ou permanência de vasão em determinados períodos, definidos como máximos, médios e mínimos, conforme a estação chuvosa ou de grande estiagem. Segundo Harlen, o que deve ser visto pela política da água é a disponibilidade hídrica, sendo a densidade populacional fator fundamental para se estabelecer disponibilidade. Resulta que no Brasil a distribuição de água não é uniforme, e que a água, silenciosamente, é limitante do desenvolvimento. Para quem afirma que o problema da água não é o mais importante, Harlen cita as palavras do jornalista e ambientalista Washington Novaes: “Se a água não é o problema mais importante, é o mais urgente pelo seu envolvimento na saúde pública e no desenvolvimento”.

Riqueza mal-distribuída

O doutor em Ciências Ambientais, Harlen Inácio dos Santos, afirmou que o Brasil é extremamente rico de água, com a maior disponibilidade hídrica no planeta. O país tem disponibilidade, mas a distribuição não é homogênea. Falta uma política efetivamente funcional para o setor. Frisou que além da escassez pela pouca disponibilidade de água, a distribuição desigual da população acarreta escassez pela demanda excessiva.

Listou como ameaças à preservação dos mananciais o lançamento de efluentes (lixo) domésticos e industriais sem tratamento; distribuição inadequada dos resíduos sólidos; destruição da vegetação ciliar; assoreamento dos rios; impermeabilização progressiva os solos; exploração crescente dos aqüíferos subterrâneos sem a realização de estudos necessários. Harlen chamou a atenção para o fato de que os rios não diluem o esgoto doméstico e industrial, mas o esgoto dilui os rios.

Ao término do Fórum do Cerrado, o palestrante comentou que a política brasileira para a questão da água é confusa, sem maior conhecimento, enquanto o governo favorece as fronteiras agrícolas, com todas as conseqüências nocivas, e sem a preservação do meio ambiente. Daí a expansão dos canaviais e das monoculturas, comprometendo grandes áreas de Cerrado.

Se um fórum sobre o Cerrado não traz ou aponta soluções imediatas, num primeiro momento contribui para maior conscientização sobre a realidade do bioma ameaçado, o que ficou evidente com os questionamentos da platéia ao término das palestras no Teatro São Joaquim.

Na seqüência O Fórum do Cerrado continua hoje, sexta-feira, 13, a partir das 8h30, no mesmo local, com palestras de Edson Sano, abordando o tema "O Cerrado e o agronegócio", e Mercedes Bustamante, com enfoque para "O Cerrado e o meio ambiente".

10º Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental
Data: de 10 a 15 de junho de 2008
Local: Cidade de Goiás
Informações: www.fica.art.br

F & M ProCultura – Assessoria de Imprensa
Flavia Miranda
Kakau Teixeira
Carolina Moraes
Thiago Stivaletti

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