segunda-feira, 2 de junho de 2008

Energia escura e futuro obscuro

Luiz Nicolaci da Costa fala sobre o estudo da energia desconhecida que domina o Universo e das preocupações em não deixar o Brasil de fora dos principais projetos mundiais na astronomia (foto: W.Castilhos)

02/06/2008 Por Washington Castilhos, do Rio de Janeiro


Agência FAPESP – Uma das tendências na astronomia é o mapeamento de extensas regiões do céu para criar amostras estatísticas que permitam estudar, por exemplo, o Sistema Solar, sistemas planetários e a estrutura das galáxias.

Um grupo de pesquisadores do Observatório Nacional (ON), no Rio de Janeiro, participa de um desses grandes projetos de mapeamento. Trata-se do Dark Energy Survey, levantamento fotométrico de 5 graus quadrados do céu, em sete diferentes filtros, que pretende investigar as características e propriedades da desconhecida energia que domina o Universo e é responsável pela aceleração da sua expansão.

Os cientistas pretendem dar um passo na direção de tentar empírica e observacionalmente caracterizar a energia escura e que influência ela tem na expansão do Universo. “A idéia é que esses dados possam ser usados para confrontar teorias físicas. No final, a física é que vai ter que explicar a expansão do Universo”, disse o astrofísico Luiz Nicolaci da Costa, coordenador da equipe do ON, à Agência FAPESP.

O Dark Energy Survey envolve também instituições dos Estados Unidos, Espanha e Inglaterra. Além do ON, participam pelo lado brasileiro pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas.

Segundo Nicolaci, a equipe do ON também poderá participar do Sloan Digital Sky Survey 3, um levantamento espectroscópico que pretende colher informações sobre a estrutura da Via Láctea.
Nicolaci foi o idealizador do encontro “A glimpse into the future of Astronomy” (“Uma olhadela no futuro da astronomia”), realizado pelo ON na semana passada e que reuniu importantes nomes da astronomia mundial para apresentar projetos que poderão delinear pesquisas para os próximos 20 anos.

O objetivo foi mostrar para a comunidade local o que está ocorrendo em outros países e como o Brasil pode se inserir nesses projetos. Além de um encontro científico, para mostrar resultados de pesquisa, o seminário, como explica Nicolaci em entrevista à Agência FAPESP, foi um evento político. Entre as questões de destaque na astronomia nacional na atualidade ele destaca a decadência do ON e a necessidade de elaboração de um plano diretor para o setor.

Agência FAPESP – O que é a energia escura e qual é a importância de seu estudo?

Luiz Nicolaci da Costa – Em 1998, algumas observações diretas de supernovas [corpos celestes brilhantes surgidos após explosões de estrelas] mostraram que o Universo estava em expansão acelerada e que isso exigia uma nova componente. Então, alguém teve a idéia de chamá-la de energia escura. Depois de anos de investigação, vimos que quase 95% do Universo é composto de coisas que não conhecemos – chame de energia escura ou de matéria escura – e de que ninguém ainda provou a existência. Simplesmente não sabemos o que é. E é isso o que estamos estudando.

Agência FAPESP – No encontro realizado no ON foram muito discutidos os rumos da astronomia mundial nos próximos anos. E no caso brasileiro, para onde ruma a astronomia?

Nicolaci – Foram colocadas importantes questões, mas, para nós, é preciso avaliar como poderemos nos inserir nesse contexto. Temos de pensar estrategicamente. A comunidade brasileira é razoavelmente grande e bastante diversa. Há uma enorme gama de interesses científicos e não será um único projeto que satisfará a todos. Então, o desafio é conciliar tudo isso, como dar prioridade aos projetos que pensem no impacto científico, na contribuição efetiva e no retorno que poderá dar. Somente trabalhando em conjunto encontraremos a solução. Poderemos pedir maior apoio governamental para viabilizar nossa participação em alguns desses projetos e, com isso, aprender e formar pessoal para a próxima geração.

Agência FAPESP – No encontro também foram apresentados projetos de muitos milhões de dólares, como o do telescópio terrestre TMT ou o do espacial James Webb. A astronomia brasileira tem condições de entrar nesse mercado no futuro próximo?

Nicolaci – A astronomia brasileira evoluiu muito. Ela praticamente não existia até meados da década de 1970. Agora, precisamos chegar à maturidade. Temos de definir um plano diretor para a astronomia nacional, para podermos otimizar os recursos da área, levando em consideração a realidade internacional, nossas vocações e o que podemos fazer.

Agência FAPESP – Como isso tem afetado o Observatório Nacional?

Nicolaci – O maior problema é que o Observatório Nacional entrou em franca decadência. Historicamente, éramos um instituto de excelência, mas perdemos nossa missão. Agora, estamos querendo recuperá-la. A principal razão de propormos o encontro [“Uma olhadela no futuro da astronomia”] é que precisamos de uma maior articulação com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Existem cinco institutos atuando na área da astronomia vinculados ao ministério, sem nenhum tipo de coordenação. A astronomia é uma ciência profundamente cara, então precisamos primeiramente de uma articulação dos institutos do MCT que atuam na área. Temos que ter uma visão conjunta de futuro. A idéia da reunião foi dar uma visão panorâmica do que está acontecendo, demonstrar como essa ciência é feita e a sua importância. O projeto que acabará mais cedo, dentre os que foram mostrados no encontro, terminará em 2013. Estamos falando da próxima década e querendo planejar como o Brasil poderá se inserir nesse contexto. A idéia é trabalhar em rede.

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