O Artigo 14, da ‘Constituição da República Bolivariana da Venezuela’, enuncia que: a lei estabelecerá um regime jurídico especial para aqueles territórios que por livre determinação de seus habitantes e com o aval da Assembléia Nacional, se incorporem à República.
Pelo Artigo 14, poder-se-ia criar, caso as populações locais assim o decidissem por voto, a Grã-República Bolivariana, uma versão atualizada da antiga Grã-Colômbia, efêmera realização unitária de Simón Bolívar. A Grã-República idealizada por Chávez, agora, prevê a reintegração da Colômbia, Venezuela, Equador, Panamá e possivelmente, a Bolívia.
Com essa colocação posta em foco podemos entender uma série de atitudes quixotescas que o presidente Venezuelano vem arquitetando como se fossem meros arroubos caudilhescos. Atitudes essas que vem ganhando simpatia de alguns mandatários populistas.
COLÔMBIA
Após ter saído fortalecido no episódio em que foram libertadas as reféns Clara Rojas e Consuelo González de Perdomo, pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), o presidente Hugo Chávez conseguiu um objetivo maior que foi o de mostrar, ao mundo, as FARC como um exército que ocupa uma região da Colômbia, com comando central e um ideal político revolucionário.
A relação entre Álvaro Uribe e Chávez saiu extremamente estremecida neste evento. Uribe afirmou que a Colômbia precisa de quem sirva de mediador com os terroristas, mas não de quem utilize a mediação para dar legitimidade ao terrorismo. Chávez afirmou, por sua vez, que não é possível a reconciliação com a Colômbia enquanto Uribe for presidente, acrescentando que espera que não o seja por muito tempo.
O presidente da Colômbia rebateu as críticas de Chávez acusando-o de Expansionista e de ter um projeto para criar um Império Venezuelano.
BOLÍVIA
O ‘Movimiento Nación Camba de Liberación’ tem um caráter nitidamente separatista, e seu objetivo é formar outro Estado, integrado pelos departamentos da "Media-Luna", formada pelos quatro Estados mais ricos do país: Santa Cruz de la Sierra, Tarija, Beni e Pando. Nessa região se encontram grandes jazidas de gás, petróleo e grande potencial agropecuário e industrial, que a convertem não só na mais rica região da Bolívia, mas em uma das de maior potencial da América Latina.
Angel Sandoval, um dos lideres do movimento declarou: "Nós temos uma cultura própria, somos uma nação. O problema é que nem os da ‘Nação Colla’, nem os da ‘Nação Camba’ se sentem representados pelo Estado boliviano. Nossa divisão é natural. A própria geografia nos divide ..."
A Venezuela tem uma participação cada vez maior em assuntos internos da Bolívia, desde que se iniciaram os projetos de nacionalização. Morales teme uma insurgência separatista e vem reequipando sua Forças Armadas, bem como estreitando os acordos de cooperação militar com a Venezuela.
O acordo possibilita uma interferência venezuelana no caso de algum problema interno que coloque em risco as instituições. Além da necessidade política de Morales se aproximar de Chávez, a já delicada economia boliviana enfraqueceu ainda mais depois dos processos de nacionalização em conseqüência da queda vertiginosa do investimento externo. Para tentar manter equilibrada a economia, e a capacidade técnica de operar os campos de petróleo e gás natural nacionalizados, Morales depende não só de tecnologia venezuelana, mas também de generosas injeções de dinheiro.
EQUADOR
O presidente Rafael Correa pretende, como bom discípulo de Chávez, colocar sob seu controle, os três poderes da República, estatizar a economia, manter sob controle os meios de comunicação e criar um regime socialista ‘moderno’, com a mesma retórica sutil e dúbia criada por Chávez para estabelecer a sua própria ditadura. Correa acredita piamente nisso, a ponto de afirmar, textualmente: “Creio que a América do Sul, em geral, se encaminha para o socialismo do Século XXI.”
GUIANA
Guiana Essequiba ou ‘Zona en Reclamación’ é a região do Planalto das Guianas, compreendida entre o rio Cuyuni e o rio Essequibo (159.500 km²), representando aproximadamente 66% do território da República Cooperativa da Guiana e reenvidicado pela Venezuela.
O Laudo Arbitral de Paris, no ano de 1899, concluiu com a cessão do território a oeste do rio Essequibo à Inglaterra. Entretanto, como a Venezuela não estava representada oficialmente, já que seus dois representantes haviam sido nomeados pelos Estados Unidos e não representavam, por isso, o estado venezuelano, esta declarou a nulidade do tratado. Outras tentativas de acordos ocorreram mas nenhuma levada a bom termo.
O artigo 10 da atual Constituição Venezuelana declara que "o território e demais espaços geográficos da República são os que correspondiam à Capitania Geral da Venezuela antes da transformação política iniciada em 19 de abril de 1810, com as modificações resultantes de tratados e laudos arbitrais não viciados de nulidade.
CONCLUSÃO
A postura de Chávez em nada lembra a figura do grande líder Bolívar, certamente o mais lúcido protagonista da Nova América, um ideólogo e um apaixonado libertador. Os ideais do, então, jovem Bolívar foram forjados em Cádis, Espanha, quando começou a freqüentar a Loja Maçônica ‘Lautaro’, onde os ‘irmãos maçons’ preconizavam as idéias de liberdade e a necessidade de lutar contra a opressão e a possibilidade de converter em Repúblicas às colônias espanholas da América. Após realizar o juramento sagrado, no Monte Sacro, em agosto de 1805, Bolívar passa os próximos vinte anos de sua vida dedicando-se de corpo e alma ao cumprimento das metas preconizadas pelos ‘irmãos de Lautaro’. Todo o seu esforço e todo seu ideário se resumia em que "o novo mundo deve estar constituído por nações livres e independentes, unidas entre si por um corpo de leis em comum que regulem seus relacionamentos externos".
Chávez e Fidel, por sua vez, embora possuindo trajetórias totalmente diferentes, procuram encarnar, segundo eles, valores e ideais que vão de encontro às aspirações permanentes do homem. Ambos recusam o projeto de globalização neoliberal e reivindicam para os seus povos o direito de construírem um futuro sem tutelas. Infelizmente as ações contrariam a retórica. Na Venezuela a Suprema Corte é totalmente subordinada ao presidente, que a dissolve quando reage aos seus interesses e empossa uma nova, com todos os membros indicados por ele. A grande diferença, porém, entre os controvertidos líderes é que Chávez é dono de 7,5% das reservas conhecidas de petróleo que alavancam sua economia e lhe permitem financiar diversos programas sociais para 80% de sua população que vive abaixo da linha de pobreza. Em contrapartida esses recursos também servem para montar a mais formidável máquina de guerra latino-americana e o tornam um motivo constante de preocupação para a harmonia dos países sul-americanos e do mundo.
Hiram Reis e Silva
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Chávez e a ‘Zona en Reclamación’
ResponderExcluir“Se o ser humano não se preocupar com aquilo
que está distante, ele encontrará tristeza
muito próximo de si.” (Confúcio)
A Guiana Essequiba, ‘Território Esequibo’, ou como os venezuelanos a apelidaram - ‘Zona en Reclamación’ (Zona em Disputa), é a região do Planalto das Guianas, compreendida entre o rio Cuyuni e o rio Essequibo (159.500 km²), representando aproximadamente 66% do território da República Cooperativa da Guiana considerada pela Venezuela como parte integrante de seu território e cuja soberania reclama a nível internacional, através do acordo de Genebra de 17 de fevereiro de 1966.
HISTÓRICO
Em 1620, os holandeses construíram numa ilha denominada Essequibo, o Forte Kijkoveral, que seria o centro da administração da Companhia das Índias Ocidentais. Em 1648, o Rei da Espanha através do Tratado de Munster reconheceu as colônias da Companhia ao longo da costa Sul-Americana.
Os conflitos Europeus, sobremaneira as Guerras Napoleônicas, fizeram com que as colônias da Guiana ficassem sucessivamente sob controle britânico e francês; após a derrota de Napoleão, porém, a Holanda retomou o controle de suas colônias americanas.
No início do século XIX, os agricultores ingleses enfrentaram grandes prejuízos econômicos e, em função desses, muitos tiveram de hipotecar seus bens aos agentes financeiros holandeses. O movimento para que a colônia se tornasse uma possessão inglesa tomou corpo, e foi efetivado formalmente em 1814, com a assinatura do Tratado de Londres.
Sob controle britânico, as colônias foram unidas como Colônia da Guiana Britânica em 1831. A Venezuela, nesse período, tornara-se República, separando-se da Colômbia e o Brasil tornou-se independente de Portugal. A partir destas mudanças políticas, novas diretrizes administrativas foram criadas, especialmente na Guiana Britânica, que iniciou uma determinada exploração e ocupação das regiões do interior, demandando o reconhecimento de suas fronteiras. Neste contexto, aparece a figura de Schomburgk, dando início à contenda entre Espanhóis e a Guiana Britânica.
LINHAS DE SCHOMBURGK
Robert Schomburgk foi contratado para definir as fronteiras da Guiana Britânica e, para tal, chegou à região em 1835. Como resultado de suas expedições, elaborou um mapa da Guiana e formalizou a proposta britânica que serviu de base para as negociações a respeito das linhas de fronteira entre Guiana, Venezuela, Brasil e Suriname. Os especialistas venezuelanos e brasileiros criticaram com veemência a maneira como essa questão foi decidida.
Schomburgk propôs como fronteira com a Venezuela a linha que sai de Amacuro até a boca do Cuyuni, seguindo o divisório de águas do Cuyuni e do Mazaruni até o Roraima, e dali descendo o Cotingo, Surumu e Tacutu. Esta linha ficou conhecida como a Linha Schomburgk.
ACORDO DE GENEBRA
No princípio da década de 60, com o governo do People’s Progressive Party (PPP) da Guiana se empenhando sistematicamente para a independência, a Venezuela manifestou preocupação em relação à questão do Essequibo, considerando que o debate a respeito do assunto já não se limitaria apenas à Grã-Bretanha. A independência da Guiana significaria o reconhecimento das atuais fronteiras por todos os países que reconhecessem o novo Estado.
A Grã-Bretanha insistia que a demanda venezuelana não procedia, e que tudo fazia parte de um processo eleitoreiro, do então candidato, Raul Leoni ao governo venezuelano visando a influenciar as eleições. Logo que Leoni assumiu a presidência, o Congresso Nacional aprovou, em fevereiro de 1965, um novo mapa oficial do país onde a área do Essequibo passou a constar oficialmente como ‘Zona en Reclamación’ e os correios passaram a utilizar, nas correspondências internacionais, um selo com o novo mapa e a frase: “hacia la reconquista de la Guyana Esequiba”, e as nacionais: “Guyana Esequiba es Venezolana”, provocando protestos do governo inglês.
A Grã-Bretanha propôs, em Genebra, uma Comissão mista que estudaria um plano de desenvolvimento econômico para a Guiana Britânica, de 1966 a 1972, somado a um projeto de cooperação econômica entre os dois países que renunciariam, por 30 anos, as reclamações por demandas territoriais.
A Venezuela não aceitou a sugestão britânica e propôs o congelamento por um prazo de 10 anos e que um ano antes de esgotado este interregno, fosse submetido à arbitragem. O resultado da proposta britânica e venezuelana originou o ‘Acordo de Genebra’ firmado em 17 de fevereiro de 1966.
O Acordo tentava encontrar uma solução através de uma comissão mista de limites, que teria um prazo de quatro anos para encontrar uma saída adequada à disputa territorial. Após esse prazo, se não houvesse uma solução de consenso, o fórum decisório seriam as Nações Unidas.
Em 1966, a Venezuela ocupou militarmente a Ilha de Ancoro. O Laudo de 1899 dividia a ilha entre os dois países e continua ocupada nestes últimos 42 anos apesar dos veementes protestos da Guiana.
Em 1968 ocorreu a ‘Insurreição de Rupununi’, na qual fazendeiros e camponeses, à frente de um movimento separatista, que contava com apoio não-declarado do governo venezuelano, ocuparam instalações governamentais, bloquearam estradas e mataram e feriram policiais da Guiana. A Força de Defesa da Guiana agiu prontamente fazendo com que os insurretos, que não contaram com o esperado apoio das Forças Armadas Venezuelanas, refugiassem-se na Venezuela sem opor resistência.
Mas o que realmente concorreu para o fracasso das operações foi a decisiva atitude do governo brasileiro, que ordenou uma imediata mobilização da Força Terrestre na área da fronteira e a concentração de aviões de combate na região de Boa Vista - RR.
En 1970, o ‘Protocolo de Porto Espanha’ congelava as pretensões venezuelanas por 12 anos, um ano antes de vencer o prazo, a Venezuela decidiu invocar o ‘Acordo de Genebra’ e propor resolver a questão na ONU. Desde 1983, a Venezuela aceitou continuar debatendo a questão procurando encontrar uma solução pacífica conforme especifica o artigo 33 da Carta da ONU. Desde 1989, ambos os países mantêm conversações sem, no entanto, apresentar qualquer solução para o impasse.
DEMANDAS ATUAIS
A Assembléia Nacional Venezuelana aprovou, no dia 13 de março de 2006, o projeto do presidente Hugo Chávez que modificava a bandeira da Venezuela acrescentando uma oitava estrela, estrela essa que era um tributo à contribuição da província da Guiana por sua luta pela independência no século XIX. Chávez disse na ocasião que: "Las ocho estrellas están ahora flameando al viento de Venezuela, las siete estrellas originales y la octava que Simón Bolivar decretó en Angostura como símbolo de la estrella de la victoria". O Exército venezuelano, comungando com os mesmos sentimentos de Chávez, reporta em sua página oficial na Internet e nos mapas de suas Divisões os limites internacionais do país agregando a Guiana Essequiba.
Em novembro de 2007, o exército venezuelano destruiu duas dragas da Guiana que eram utilizadas para o garimpo do ouro na região da fronteira. Até hoje não se sabe se as dragas revolviam os sedimentos do rio Cuyuní, que fica em território guianense, ou do rio Wenamú, que divide os dois países. Ninguém ficou ferido, mas o episódio chamou a atenção para a contenciosa tríplice fronteira entre Brasil, Venezuela e Guiana.
FORÇAS ARMADAS
A Força Armadas da Venezuela tem um efetivo de 56.000 militares, 190 tanques, 6 fragatas, 2 submarinos, mais de 90 aeronaves de combate e mais de 20 helicópteros de ataque, enquanto a Guiana tem 1600 homens, 3 lanchas de patrulha e nenhum avião de combate. O enorme desequilíbrio militar nos leva a inferir que, em caso de conflito, a Guiana contará com apoio de outros países no confronto.
ESTABILIDADE POLÍTICA AMERICANA
Hoje, a Venezuela, aproveitando-se da inépcia da política externa brasileira, procura assegurar uma posição política hegemônica na América Latina. A disputa pela ‘Zona en Reclamación’ parece, no momento, ter sido relegada a um plano secundário. Porém, os grupos chamados de pró-essequibanos, com apoio velado das autoridades venezuelanas, proliferam e ganham cada vez mais simpatizantes cujo objetivo final é a recuperação da região de Essequibo.
A conquista da região pela Venezuela levantaria velhas questões sobre limites em toda Sul-América. A Colômbia tem velhas pendências territoriais contra a Venezuela de modo que, se a Venezuela atacasse a Guiana, a Colômbia encontraria justificativa para reivindicar seus antigos limites com a Venezuela. O Peru, por sua vez, poderia reavivar sua questão fronteiriça com o Equador e nem mesmo o Brasil ficaria de fora já que sobre a Questão do Pirara, até hoje, pairam dúvidas quanto à lisura da forma com que foi conduzida.
Hiram Reis e Silva
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